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domingo, 19 de janeiro de 2014

O Programa Minha Casa, Minha Vida prevê 700 mil novas moradias para o ano de 2014, confira

Projeto habitacional MC/MV

Com desafio de sanar déficit de mais de 6 milhões de casas, governo deve investir R$ 30 bilhões.

A questão de habitação no Brasil ainda representa um desafio para a política brasileira. Com décadas sem programas de incentivo no segmento, o país acumulou um déficit habitacional gigantesco entre as famílias mais pobres, que buscaram alternativas com construções informais em áreas periféricas e morros. A criação do programa Minha Casa, Minha Vida, em 2009, tenta reverter esse quadro, construído com anos de inexistência de políticas públicas no setor de habitação. O benefício, que já investiu R$ 198,6 bilhões, equivalente a três milhões de unidades habitacionais desde sua criação, promete construir aproximadamente 700 mil moradias para 2014. No entanto, mesmo representando novo fôlego para o acesso à casa própria, especialistas afirmam que o programa deve exercer alguns reajustes na sua execução.

Para 2014, o Ministério das Cidades prevê investimento de aproximadamente R$ 30 bilhões no programa. Ao surgir em 2009, o programa foi tido como o primeiro de habitação federal desde 1986, após o fim do Banco Nacional de Habitação (BNH), voltado para o financiamento e produção de empreendimentos imobiliários. Hoje, mesmo com a atuação do recurso, que já garantiu residência a mais de 1,4 milhão de famílias, o déficit habitacional no Brasil equivale a 6,94 milhões de domicílios, de acordo com o Censo 2010, o que representa um longo caminho a ser percorrido para sanar o problema.

O presidente do Instituto Brasileiro de Arquitetos do Rio de Janeiro (IAB-RJ), Pedro da Luz Moreira, exalta o programa, que tem conseguido atingir as famílias que mais sofrem com o déficit habitacional: com renda entre 0 e 3 salários mínimos. Essas famílias, que garantiram suas moradias de maneira informal, agora podem ter acesso à habitação própria formalizada.

“O programa "Minha Casa, Minha Vida" tem grande mérito. Com a extinção do BNH em 1986, de lá pra cá o país não tem tido, do ponto de vista de articulação nacional, um programa habitacional. Tem o mérito de tentar recriar essa política habitacional. Todos sabemos as faixas onde estão concentrados os déficit habitacionais: nas famílias que ganham de 0 a 3 salários mínimos, que são as mais frágeis em acessar o mercado formal. Não são atendidas pelo mercado formal, se viram de outra maneira, através da autoconstrução, nas favelas. O programa tem esse mérito. É um programa que todo país desenvolvido no mundo teve”, elogia.

O programa atua de forma nacional, com impacto significativo em todos os estados brasileiros. O que mais recebeu unidades habitacionais foi o estado de São Paulo, com 559.985 casas, seguido por Minas Gerais, Bahia, Rio Grande do Sul, Paraná e Rio de Janeiro. Somadas, as unidades dos seis estados equivalem a um investimento superior a R$ 115 bilhões, recursos repassados diretamente às empresas, e não para os entes públicos. Roraima, estado contemplado com o menor número de unidades, recebeu 8.370 residências do programa, no valor total de mais de R$ 432 milhões.

Apesar do impacto positivo levantado por Pedro da Luz, o arquiteto e urbanista afirma que o Minha Casa, Minha Vida comete falhas realizadas por programas do passado, principalmente do BNH. Para ele, o grande problema que deve ser reavaliado na execução do benefício é perceber que as construções devem ser feitas nas regiões centrais da cidade, e não nas periferias, como vem sendo feito.

“O que vem acontecendo, depois de lançado, que a gente começa a perceber, é que o programa repete erros do BNH. Se amplia o perímetro da cidade brasileira, porque só nas periferias você tem acesso à terra mais barata, e isso viabiliza o empreendimento. Mas, na verdade, isso é antipolítica urbana. O correto é se esforçar para não expandir a cidade, mas fazer ela mais compacta. E o programa está fomentando a expansão da cidade. É ruim do ponto de vista da política habitacional. Você pega a Rodovia Presidente Dutra, e vê que tem empreendimentos realizados onde não existe cidade. Era para o governo incentivar o contrário: construir perto do Centro, e não em Queimados [na Baixada Fluminense]”, critica Pedro. 

O presidente do IAB-RJ explica que essa mudança no planejamento garante integração das classes mais baixas, que passa a ter acesso aos locais da cidade onde estão concentrados emprego, acesso à informação, saúde, saneamento e educação de mais qualidade, o que garante melhores oportunidades para essas famílias. Para Pedro, encurralar os conjuntos habitacionais nas periferias não representa mudança na realidade dos novos moradores.

“Grande parte do emprego está concentrada na região do Centro da cidade, para você resolver o problema habitacional dessas populações fragilizadas, tem que ser nesses lugares. Elas precisam se inserir no mercado, perto dos lugares para os filhos estudarem com qualidade. A cidade tem que ser vista como um bastião de oportunidades. Essas famílias fragilizadas, que não têm acesso à informação, escolaridade, mas se inserindo no contexto urbano, os filhos dessas famílias têm a chance de ter acesso a tudo isso. E isso se consegue perto dos Centros da cidade”, explica.

Outra mudança deveria ser empreendida para o arquiteto: unir dentro dos mesmos conjuntos habitacionais famílias de diferentes estratos sociais, garantindo interação e troca de conhecimento entre indivíduos com diferentes vivências e realidades.

“Deveria ter um mix de rendas nas habitações, para que não colocasse nesses conjuntos habitacionais apenas pessoas com renda de 0 a 3 salários mínimos, mas ter pessoas de outros estratos sociais. Isso significa ascensão das classes a um patamar de informação maior, para que o filho dessas famílias tenha condição de formação melhor que a dos pais. O governo deveria incentivar implantações com tipologias diversificadas, estratos sociais diversificados, em posições mais centrais na cidade”, sugere o presidente da IAB-RJ.

Um dos problemas que têm sido identificados no programa Minha Casa, Minha Vida é a dificuldade das famílias, em grande parte vindas de comunidades e favelas, em se adequar à realidade de um conjunto habitacional formal. Problemas de convivência entre os vizinhos; inadimplência de contas de água, luz, gás e condomínio; construção de puxadinhos para atividades que geram renda, entre outras complicações que repetem a lógica das favelas. A dificuldade de adequação a nova realidade é explicada pela construção das residências do Minha Casa, Minha Vida não levarem em consideração as particularidades e problemas das famílias, de acordo com Pedro da Luz.

“Cada um desses locais demandam projetos específicos, e não projetos repetidos. As construtoras vêm repetindo sem ver as especificidades dessas famílias. O grande problema é a produção massiva sem olhar para essas especificidades. O erro do BNH foi não identificar o perfil de cada uma das famílias, e isso vem se repetindo”, aponta o arquiteto.

Além destes, reclamações sobre problemas nas unidades habitacionais entregues, como infiltrações e rachadura, têm sido apontados por moradores. O Ministério das Cidades reconhece que dificuldades são observadas em casos pontuais, e que as Prefeituras devem oferecer serviços que orientem as famílias após a aquisição de suas casas. “Um dos maiores desafios do programa Minha Casa, Minha Vida é que os municípios brasileiros sejam capazes de fornecer os serviços e equipamentos públicos necessários para as famílias que são atendidas nos empreendimentos”, revela a assessoria do Ministério. Ainda de acordo com o órgão, para garantir a qualidade na construção das residências, foi criado o Programa de Olho na Qualidade Minha Casa, Minha Vida pela Caixa Econômica Federal. Há também serviço de atendimento para que dúvidas sejam tiradas e orientações sejam feitas.

Sobre a especulação imobiliária, principalmente em bairros elitizados, Pedro da Luz ainda explica que o desequilíbrio em investimentos em infraestrutura faz com que o valor da terra urbana nesses locais atinja preços estratosféricos, por isso a escolha da construção dos empreendimentos nas regiões periféricas. O urbanista acrescenta que o déficit habitacional brasileiro pode ser sanado do ponto de vista quantitativo – 6 milhões de residências – mas que isso não é suficiente se a questão de habitação não for encarada do ponto de vista qualitativo.

“Ainda há um déficit habitacional imenso, correspondente a aproximadamente 6 milhões de unidades, se não me engano. Fazendo uma multiplicação rápida por três, que é o número médio de pessoas por família, você precisa atender 18 milhões de pessoas. É muita gente. O problema é que se você for olhar para quantidade que deve produzir, você pode terminar com esse déficit. Termina, mas de maneira ruim. Você pode chegar a produzir, mas se não produzi-las no lugar certo, gera custos insuportáveis para a cidade e para as famílias.

O déficit não deve ser encarado apenas do ponto de vista quantitativo, mas também do qualitativo. Tem que se produzir tantas unidades, mas produzir aonde? Em locais onde haja emprego. Se olhar apenas para um número, e atingi-lo de maneira fordista, industrial, você vai acabar criando um monstro e repete experiências anteriores”, teme. 

Agência Brasil/JB
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